O final do show do Capital Inicial
estava tumultuado. Na verdade, todo o show estava tumultuado. Fazia anos que a
banda de Brasília não vinha na cidade e ninguém poderia perder essa
oportunidade. Logo, era de se esperar uma casa lotada mesmo que em plena terça-
feira. As últimas músicas já ditavam o tom de despedida da banda.
Fabiana estava em um misto de
sentimentos, ainda estava stressada pelo início de semana caótica, queria
espairecer um pouco e o show caiu como uma luva. Mas se sentia uma forasteira
por não ver ninguém conhecido, visto que seus amigos de 40, 50 anos agora
preferissem ficar em casa ou se limitar a barzinhos e cinemas onde tem lugares
para sentar. Mesmo que o show tocasse músicas da sua época. Ao mesmo tempo,
isso pouco importava, Fabiana estava em pleno êxtase, claro que o efeito
da cocaína no cérebro fazia toda a diferença. O incomodo de estar sendo
observada por uma loira há uns 15 minutos já estava se transformando em
curiosidade. Apenas encostada na parede, ela apenas observava Fabiana
fixamente, sem nem disfarçar o interesse. De alguma Forma, parecia alguém
distante, uma ex namorada, talvez. Estava alta demais pra lembrar. A plateia
estava alucinada ao som de “À Sua Maneira”, mas para Fabiana- e talvez para a
loira desconhecida- só havia elas duas ali. Fabiana se sentiu uma menina de 20
anos de novo e caprichava na dança, afinal, não podia perder essa oportunidade,
não era todo dia que uma mulher mais nova demonstrava tanto interesse que não
fosse para conseguir algum emprego ou alguma empregada “puxando o saco”
querendo mantê-lo.
Num momento em que Fabiana girou o
corpo, não se sabe se foi ela que estava lenta com a parte da música ou se a
desconhecida tem algum poder de teleporte, mas o fato é que de repente estavam
frente-a-frente. A loira apenas manteve um sorriso cativante e venenoso.
Mas o que Fabiana não pôde deixar de reparar era em seu olhos. Tinha algo de
firme neles. Algo desafiador, ameaçador, até. Apesar de novos, tinham muita
história, e algo familiar. Ela já viu aquele olhar antes. Havia algo selvagem
neles, algo como uma...
-Você! É Voc..
Um beijo dado pela loira interrompeu o
raciocínio, a música ainda rolava, a multidão ainda agitada e Fabiana queria
gritar, sair correndo. Mas seu corpo entorpecido não obedecia, já não estava
obedecendo na verdade... O terror do momento foi se apagando com algo fino
perfurando a área do rim e o mundo foi se apagando junto com o final da
música.