Estávamos sentados à mesa do jantar
comendo as batatas que sua mãe à pouco cozinhara, olhar para ele ali em minha
frente dizendo coisas que pouco me importavam era estanho, sempre fiz isso, mas
desta vez soava como um egoísmo forçado de minha parte. Nada era igual há sete
anos, ele parecia mais jovem e carregava em si uma energia invejável, enquanto
eu apresentava o semblante cansado de uma velha esclerosada, mas não era um
cansaço físico, era algo mental, como se minha mente não processasse mais tudo
aquilo que ele dizia. Eu só precisava olhar, observar seus lábios mexendo
ritmados enquanto seus olhos arregalados acompanhavam o compasso de sua cabeça
que subia e descia numa forma de código para saber se eu estava entendendo ou
não. Minha cabeça respondia que sim. Porém por dentro eu só conseguia pensar
cala-a-boca-seu-cretino. Por muitas vezes pensei comigo mesmo enquanto ele
fazia seu interminável monólogo sorte-sua-que-eu-te-amo, e talvez seja sorte
mesmo, uma sorte filha da puta que eu saiba de tantas falhas e ainda continue
me deitando com ele todas as noites, que eu ainda ouça coisas que para mim não
fazem o menor sentido, mas continue concordando com a cabeça para ver aquele
sorriso de satisfação enquanto só quero que se cale. O jantar meio improvisado demorou
de chegar ao fim. Enfim colocamos os pratos sobre a pia, eu sabia exatamente
onde aquilo iria acabar, ou melhor, não iria, nada acaba quando se trata de
nós, fica tudo pairando como uma interrogação solta num papel A4, sentei-me na
cama cruzando as perna estilo indiozinho enquanto ele trocava de roupa para
dormir. Esperei que parasse em minha frente já de pau duro e me pedisse para
chupá-lo, não o fez, fiquei olhando com a cabeça baixa e os olhos virados para
cima, código perfeito para dizer quero-te-chupar sem ter que dizer
quero-te-chupar. Fico feliz quando ele entende sem precisar dizer, apenas vem,
coloca o pau em minha boca, e deixa com que eu faça o resto. Eu poderia
chupá-lo a noite inteira, talvez meu egoísmo termine aí, talvez seja aí que eu
demonstre meu perdão, o silêncio que paira sobre esse momento de entrega
unilateral seja o meu perdão, eu preciso disto, da sua fala hipócrita dizendo
que me ama depois de receber um belo boquete, das suas mãos envolvendo-me por
completo enquanto dormimos. A noite carrega a angústia de tê-lo de volta, eu
poderia ter deixado ir, meu egoísmo me assusta, eu o trouxe de volta e o prendi
num mundo no qual ele não cabe mais. Um mundo que não cabe nós dois, que não
cabe as suas falas exageradas, mas eu o trouxe. Agora carrego a
responsabilidade de ter que perdoar, de ouvir o que não quero ouvir, de sibilar
que entendo quando não entendo nada, de amar, de fazer com que não vá outra
vez. Talvez eu seja recompensada por isso com mentiras que preciso escutar ou
talvez nunca seja, e eu acorde deste engano antes que ele desperte pela manhã
muito cedo, e me acorde com um beijo, fazendo que eu mais uma vez desista de
tudo e apenas fique.
Ilana Maia
Sensacional!
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