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segunda-feira, 25 de agosto de 2014

E Com Vocês...



Estávamos sentados à mesa do jantar comendo as batatas que sua mãe à pouco cozinhara, olhar para ele ali em minha frente dizendo coisas que pouco me importavam era estanho, sempre fiz isso, mas desta vez soava como um egoísmo forçado de minha parte. Nada era igual há sete anos, ele parecia mais jovem e carregava em si uma energia invejável, enquanto eu apresentava o semblante cansado de uma velha esclerosada, mas não era um cansaço físico, era algo mental, como se minha mente não processasse mais tudo aquilo que ele dizia. Eu só precisava olhar, observar seus lábios mexendo ritmados enquanto seus olhos arregalados acompanhavam o compasso de sua cabeça que subia e descia numa forma de código para saber se eu estava entendendo ou não. Minha cabeça respondia que sim. Porém por dentro eu só conseguia pensar cala-a-boca-seu-cretino. Por muitas vezes pensei comigo mesmo enquanto ele fazia seu interminável monólogo sorte-sua-que-eu-te-amo, e talvez seja sorte mesmo, uma sorte filha da puta que eu saiba de tantas falhas e ainda continue me deitando com ele todas as noites, que eu ainda ouça coisas que para mim não fazem o menor sentido, mas continue concordando com a cabeça para ver aquele sorriso de satisfação enquanto só quero que se cale. O jantar meio improvisado demorou de chegar ao fim. Enfim colocamos os pratos sobre a pia, eu sabia exatamente onde aquilo iria acabar, ou melhor, não iria, nada acaba quando se trata de nós, fica tudo pairando como uma interrogação solta num papel A4, sentei-me na cama cruzando as perna estilo indiozinho enquanto ele trocava de roupa para dormir. Esperei que parasse em minha frente já de pau duro e me pedisse para chupá-lo, não o fez, fiquei olhando com a cabeça baixa e os olhos virados para cima, código perfeito para dizer quero-te-chupar sem ter que dizer quero-te-chupar. Fico feliz quando ele entende sem precisar dizer, apenas vem, coloca o pau em minha boca, e deixa com que eu faça o resto. Eu poderia chupá-lo a noite inteira, talvez meu egoísmo termine aí, talvez seja aí que eu demonstre meu perdão, o silêncio que paira sobre esse momento de entrega unilateral seja o meu perdão, eu preciso disto, da sua fala hipócrita dizendo que me ama depois de receber um belo boquete, das suas mãos envolvendo-me por completo enquanto dormimos. A noite carrega a angústia de tê-lo de volta, eu poderia ter deixado ir, meu egoísmo me assusta, eu o trouxe de volta e o prendi num mundo no qual ele não cabe mais. Um mundo que não cabe nós dois, que não cabe as suas falas exageradas, mas eu o trouxe. Agora carrego a responsabilidade de ter que perdoar, de ouvir o que não quero ouvir, de sibilar que entendo quando não entendo nada, de amar, de fazer com que não vá outra vez. Talvez eu seja recompensada por isso com mentiras que preciso escutar ou talvez nunca seja, e eu acorde deste engano antes que ele desperte pela manhã muito cedo, e me acorde com um beijo, fazendo que eu mais uma vez desista de tudo e apenas fique.

Ilana Maia


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